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11 de agosto de 2014

Hoje o blog é da Adelaide de Sousa


Hoje o blog é da minha amiga Adelaide de Sousa, apresentadora e autora do blog My Favorite Things


Há um assunto velho como o Tempo que tem feito muitas parangonas na internet. Porquê, não sei. Posso supor muita coisa, posso tirar ilações, posso dar a minha opinião que, a julgar pelo que tem sido escrito nos últimos anos sobre o assunto, vai com certeza incomodar algumas pessoas e até mesmo irritar outras. É provável que se fosse só por mim, nem sequer o abordasse, quanto mais não seja por evitar os comentários no meu blog a que teria mesmo de responder, quanto mais não fosse por cortesia. Mas como este post vai para o blog da minha amiga Carmen, fica ela depois com a batata quente...

Amamentar em público passou a ser uma questão que suscita o opinar das pessoas. Estou em crer que isto, per si, é reflexo dos tempos. Posso imaginar que, antes do advento do leite artificial, as pessoas amamentavam como amamentam ainda em muitos locais da Terra: quando a criança pede para comer. Em casa, no campo, a caminho da igreja, amamentar acontecia muitas vezes – em público e em privado. Parece que, agora que as mulheres passaram a poder dispor dessa ferramenta de emancipação que se chama biberão, só saca da mama em público quem quer mesmo chocar. Não é assim? 


Bem, se me perguntam, a mim - que fui amamentada até aos 5 anos onde calhava, que tive um avô médico que aos 7 anos usava o banquinho de mamar para se servir de uma porção generosa da minha avó enquanto a senhora trabalhava na cozinha, que amamentei o meu filho para lá dos 4 anos e que para o fazer tive de ignorar alguma desinformação de muitas testemunhas desse tão rebelde acto, mas que também recebi muito encorajamento por parte de estranhos e familiares – não, amigos. Não vos quis chocar. Quis, imaginem, alimentar o meu filho exactamente como o faz alguém que abre um pacote de leite para dar a uma criança com sede. Sim, eu sei que para abrir um pacote de leite não temos de mostrar as mamas. Sim, tenho consciência que há locais onde qualquer exposição de um pouco de pele entre o pescoço e os tornozelos gera a revolta geral e um castigo exemplar. Não, não sabia é que estava num país em que a lei da Sharia se aplicava.

Digo-vos mesmo mais: sei que não estou num país em que esta questão seja válida. Penso que, com o fenómeno da globalização (que não é mais do que uma aculturação dos maneirismos americanos) e das redes sociais (que também são um invento dos senhores), estamos a comprar uma polémica que não nos pertence. É o chamado hype do momento, gerado pelo facto de estarmos a passar pelo Mês Internacional da Amamentação. Esta discussão não é nossa, senhores! Não temos Estados como o Idaho, onde dar de mamar em público é uma ofensa punida por lei, equiparada à do tarado que mostra a genitalia a uma criança na rua...somos tugas! Graças a Deus! Lá, tinha de ir dar de mamar ao quarto quando tinha visitas e tapar-me com uma burca se estivesse no Metro, mas aqui? Nada disso. 


Sei que, na esmagadora maioria das vezes, as pessoas sorriam quando eu dava de mamar ao meu filho, onde quer que fosse, e que se contam pelos dedos das mãos as vezes em que me senti mal por estar a fazer em público. Lembro-me de uma ocasião, na área da restauração do Centro Comercial Colombo, em que o Kyle teria uns 8 ou 9 meses. Tirei a maminha para fora naturalmente, para a criança poder comer, e depois até tive o cuidado de cobrir uma boa parte da pele com o top que estava a usar. Ainda assim, numa questão de minutos, tinha dois mirones embasbacados a olhar para mim. E lançavam uns olhares tão lascivos que encurtei a refeição do miúdo e pus-me a andar. No caminho, dei de caras com uma conhecida minha que, com a filha mais velha ao lado, dava de mamar ao bebé de uns 3 meses – completamente descoberta. Olhei para ela embasbacada (se calhar fiz a mesma cara que os mirones) e disse-lhe: “Sabes que eu estava a fazer o mesmo e tive de parar por que havia uns pacóvios a babarem-se?”. Resposta sábia: “Estou-me nas tintas para eles.” E com esta mãe experiente aprendi a lição. Se não temos a mama na cara dos outros – até porque ela tem mesmo é de estar na cara do miúdo – que me importa a mim como olham? E porque devo eu deixar que uma minoria me faça sentir mal com um dos actos mais ancestrais, naturais, benéficos, económicos e ecológicos que podemos ter em 2014?

Penso que vivemos numa época estranha em que, como diz o pediatra Carlos González no seu Manual de Aleitamento Materno, chamamos vício à virtude, e à virtude chamamos vício. Se as fotos que aparecem nesta altura ajudam ou não a causa da amamentação? É essa a pergunta? Bem, passada a onda, se permanecermos, se mostrarmos que não amamentamos só quando se fala disso nem tiramos fotos só para armar aos cágados, penso que sim. Penso que quanto mais dermos de mamar, mais meninas irão fazer essa escolha no futuro, mais mulheres e homens (grandes incentivadores desta escolha, diz a estatística) se baterão pelo direito às licenças de parentalidade prolongadas, e pelos horários reduzidos para as mães que amamentam mesmo para lá dos 12 meses de idade. E principalmente, iremos deixar de equacionar mulher que amamenta com mulher que não trabalha. Trabalhar e amamentar não têm de ser escolhas que se anulam uma à outra. Afinal, como disse a minha amiga Sandra Oliveira, da Bionascimento, a recomendação de amamentar em exclusivo tem aumentado conforme as licenças de maternidade foram surgindo e sendo alargadas, e não o contrário. Dá que pensar... 


Deixo-vos com mais uma imagem de uma celebridade a amamentar. É uma senhora muito conhecida, cuja foto também foi banida das redes sociais ali por volta do Concílio de Trento...espero que não choque demasiado a sensibilidade do século XXI. Se aguentarem, podem ir vê-la ao vivo, no Museu de Alberto Sampaio, em Guimarães. Boa viagem!

1 comentário:

  1. Parabéns pelo excelente testemunho e fotos. Frontal, sem rodeios, mordaz. Um beijo às duas

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