Chef José Avillez | Na Primeira Pessoa

O Chef José Aviilez dispensa apresentações. Passou pela cozinha de grandes mestres mundiais, trabalhou no “El Bulli”, um dos melhores restaurantes do Mundo, e é detentor de alguns dos espaços mais emblemáticos da capital, como é o caso do Belcanto e do Cantinho do Avillez, que deu recentemente nome a um livro com o mesmo nome. Vamos desvendar um pouco mais sobre este conceituado Chef...

José Avillez licenciou-se em Comunicação e Marketing com uma tese dedicada ao estudo da gastronomia portuguesa. Quando descobriu que a sua verdadeira paixão era a cozinha? 

Eu sempre gostei muito de cozinhar mas informalmente, não profissionalmente e no terceiro ano do curso de Comunicação Empresarial achei porque não pensar mais seriamente sobre a hipótese de me tornar profissional na área da cozinha e foi nessa altura, na sequência de uma prova de vinhos que fiz e de umas conversas que tive com a Maria de Lurdes Modesto, que surgiu essa possibilidade e passaram agora 13 anos e cá estamos.

 
Começou no Forte do Guincho em Cascais, tendo passado pela cozinha de grandes mestres mundiais. De que forma foi importante este percurso? Como foi o primeiro contacto?

Muito importante, de tal forma que dizia "quero aprender com os melhores para um dia quem sabe poder ser como um deles". Por isso sempre fui muito focado em escolher as pessoas e as cozinhas onde trabalhei e estagiei e tento, ainda hoje, todos os dias, aprender qualquer coisa quando saio da cama e se não aprendi nada nesse dia é porque o dia não correu bem.

 
De todos os projectos em que esteve envolvido qual/quais mais o marcaram?

Assim em geral, quer dizer, eu consigo-te diferenciar entre duas linhas...Os meus projectos pessoais e aí eu diria que o Belcanto agora é um projecto que me marca muito e tudo o que eu faço hoje em dia obviamente que me marca. De projectos que não foram meus, sem dúvida o “El Bulli” onde estagiei. Dos meus primeiros projectos, trabalhei com o José Bento dos Santos, fiz umas conversas com a Maria de Lurdes Modesto, o estágio na Fortaleza do Guincho…Como foram os primeiros contactos também me marcaram muito. Essencialmente acho que é isso.

 
Como surgiu o “Cantinho do Avillez”? 

O Cantinho é um projecto antigo, um bocadinho de conseguir fazer uma cozinha que me apetece comer todos os dias. É bastante variado, tem cozinha portuguesa mas também cozinha influenciada por vários países do Mundo, por viagens que eu vou fazendo, por técnicas novas que vou aprendendo, num ambiente muito descontraído de amigos, família, por isso nasce dessa paixão não só pela comida mas também pelo convívio e pelo entretenimento, onde a pessoa pode estar a comer bem mas essencialmente a ter um bom momento de convívio.

No livro que lançou recentemente com o mesmo nome refere que já serviu pessoas dos 4 cantos do Mundo, qual é o segredo de tanto sucesso? Como define o tipo de comida servido no Cantinho?

É muito difícil definir, é um pouco o que eu disse antes, uma cozinha contemporânea com inspirações portuguesas e de viagens. Acho que o sucesso se deve a uma equipe que trabalha muito todos os dias, uma grande equipe que trabalha para conseguir que as pessoas gostem e voltem e que as que não voltam, porque são estrangeiros, que falem aos amigos e à família que vêm a Lisboa e por isso essencialmente é a qualidade que é o segredo. Como se chega à qualidade…É com dedicação, disciplina e com vontade de fazer melhor.

Qual a importância de ter tido a visita de Anthony Bourdain? Com que imagem ficou dele?

Foi muito importante, eu estava muito nervoso porque fui uma das pessoas que organizei o tour dele por cá, pediram-me para ajudar a recomendar alguns sítios. Foi muito importante em termos de divulgação. Pessoalmente também gostei muito de o conhecer, achei uma pessoa de facto muito interessante, com uma grande cultura gastronómica e não só, por isso gostei muito de o conhecer e é sempre um marco. Fui ali chamado um pouco como embaixador da cozinha portuguesa também e por isso estava sempre com muito medo do que ia dizer, de como poderiam interpretar mas foi um marco de facto muito importante.

O Restaurante Belcanto (onde nos encontramos) é emblemático na Lisboa da segunda metade do século XX, pode falar-nos um pouco sobre isso?

O restaurante Belcanto abriu em 1958, aqui, no Largo de S. Carlos, junto ao Teatro Nacional de S. Carlos e à casa onde nasceu Fernando Pessoa. Esta localização privilegiada, o ambiente sóbrio e sofisticado e o serviço discreto conquistou as elites políticas e económicas que fizeram do Belcanto um ponto de encontro obrigatório. O Belcanto também era frequentado por artistas que actuavam no S. Carlos.

Quais as principais diferenças entre o Belcanto e o Cantinho do Avillez?

No Belcanto ofereço uma nova alta-cozinha portuguesa num ambiente sofisticado que ainda mantém um certo romantismo do antigo Chiado. Esta é a cozinha que verdadeiramente me define como Chef e expressa a minha evolução. No Cantinho do Avillez ofereço uma boa cozinha de inspiração portuguesa com influências de viagens num ambiente muito descontraído e informal. O Cantinho do Avillez é o restaurante onde eu gostaria de ir todos os dias.

Neste momento é apresentador de um programa de televisão, escreve livros. Acha que faz parte da sua formação de Marketeer? Como consegue conciliar tudo?

Sim acho que a minha formação de base obviamente que me ajudou muito também nestes projectos, neste lado mais empresarial. Ajudou-me muito mas acho que aqui o truque, que acaba por não o ser, é o trabalhar em equipe, o escolher e ser escolhido por pessoas que estão à minha volta, que partilham da minha paixão e um bocadinho da minha loucura de fazer tantas coisas ao mesmo tempo. É o maior segredo de todos que eu não guardo e por isso digo aqui ao vivo para o blog Breakfast@Tiffany`s.

Eu penso muitas vezes se eu pudesse fazer diferente em termos de formação o que é que eu faria e acho que se calhar voltava a fazer a Universidade, voltava a passar por tudo, porque o que eu sei hoje é fruto do que eu vivi nesses anos de formação também…Conheci pessoas muito interessantes, abriu-me bastante os horizontes, estudei várias áreas, cheguei a trabalhar na área, pelo menos em estágios, por isso foi importante para mim em termos do negócio o que me dá também uma liberdade e uma capacidade depois para ajudar a promover os meus projectos.

Participou também em várias iniciativas para promover a alimentação saudável, sobretudo com crianças. Considera que a educação alimentar é fundamental desde tenra idade? Acha que os portugueses estão a ficar mais gordos? Tem alguma dica para continuarmos a comer as suas deliciosas iguarias e continuarmos em forma?

Eu não sou dietista, nem nutricionista, sou cozinheiro. Cozinho essencialmente para dar prazer às pessoas que se sentam às minhas mesas. Tenho preocupações obviamente com a qualidade dos produtos e a não utilização de gorduras em excesso, e de más gorduras, não tanto com uma preocupação de saúde (mas também) mas por sentir que a seguir a uma refeição onde se utilizou muita gordura a pessoa não se sente bem. Penso sempre que a refeição deve ficar na cabeça e não no estomago passado umas horas. Por isso acho que o truque para continuarem a comer a minha cozinha e continuarem em forma, e podem comer à vontade porque não engorda, é que não se façam exageros.

Obviamente que acho muito importante em termos de formação de base que as crianças comecem a aprender a comer. Acho que passa também primeiro por uma fase até de distinguir ingredientes, que não sabem. Há pessoas que não sabem distinguir uma maçã de uma laranja, pessoas, crianças, e isso é muito importante. Eu acho que devia haver mesmo, e não é só puxar a brasa à minha sardinha, no ensino nacional, desde muito pequeno a pessoa ter uma disciplina onde abordasse mais gastronomia. Podia ser o que se chama hoje em dia o Estudo do Meio ou noutras disciplinas já existentes mas que houvesse de facto uma área onde se falasse mais de cozinha. Não é ensinar a cozinhar mas alguns pressupostos culinários e na base de “olha isto faz bem, isto faz mal, isto deve-se comer muito, isto deve-se comer pouco…”

Novos Projectos para 2014?

Isso não posso dizer :). Não, temos sempre imensos projectos mas essencialmente o que pensamos sempre é reforçar a qualidade dos que temos, continuar a empregar estas pessoas todas. São 84 pessoas na empresa hoje em dia…

E nota-se a diferença desde que começou a crise?

Eu abri estes projectos todos em plena crise. O mais antigo, que é o Cantinho, foi em Setembro de 2011, já estávamos no auge da crise, por isso não sei muito bem, acho que se nota. Quando tenho mais estrangeiros eles consomem mais do que os portugueses mas, mesmo antes da crise, os estrangeiros em geral, pelo menos os que vêm aos meus restaurantes, têm mais poder de compra…Mas acho que se nota, principalmente ao fim do mês a pagar o IVA isso nota-se bastante, porque o aumento do IVA é reflexo também da crise...Mas o mais importante é de facto continuarmos a acreditar, mesmo que às vezes sejamos os únicos, continuar a acreditar e a lutar. Acordar mais cedo do que queria acordar, trabalhar um bocadinho mais do que queria trabalhar, há uma serie de premissas que normalmente assentam em fazer sempre um bocadinho a mais do que era suposto, que me leva e que nos levam depois a conseguir ser melhores.

Entrevista realizada no Belcanto

Look do dia

Camisola Oysho | Calças H&M | Botins Luís Onofre com cristais Swarovski

Agradecimentos:

Sisley Make-up

Créditos Fotográficos:

Rute Obadia fotografia